O radicalismo sobre a neutralidade
Além da polêmica em torno da votação do veto do Executivo Municipal ao Projeto de Lei que proibia a linguagem neutra nas escolas de Palmas e em editais de concurso público, outro fator revelou um problema social muito mais profundo que é a sensibilidade das pessoas às pautas sobre costumes.
Desde a eleição de 2018 essa pauta entrou na vida do brasileiro de maneira muito forte, desnudando uma postura que até então estava escondida em alguns indivíduos. Sendo justo, cabe pontuar de maneira contundente que essa sensibilidade tem a mesma medida nos indivíduos mais conservadores e naqueles mais liberais.
Exemplos temos aos montes. Um deles é a atitude de movimentos evangélicos ao veto do Executivo ao Projeto de Lei que proibia a linguagem neutra nas escolas de Palmas, a que me referi no início deste artigo. Quanta mentira foi contada sobre o assunto. Pessoas utilizaram das redes sociais para dizer absurdos sobre uma situação tão simples. Líderes políticos e religiosos sapatearam sobre o tema, fizeram dele um palanque para ganhar likes e curtidas, sem qualquer responsabilidade com a verdade dos fatos.
Que fique claro que o Poder Público nunca ordenou a utilização da linguagem neutra nas escolas de Palmas ou mesmo em editais públicos. Isso nunca aconteceu, mesmo que várias pessoas tenham propagado o contrário de maneira leviana. O veto não quer dizer que a linguagem neutra será usada nas escolas, mas sim que o Executivo Municipal não tem competência para legislar sobre o assunto. Essa é uma atribuição do Governo Federal. Não há dúvida sobre isso.
A prefeita Cinthia Ribeiro se manifestou no Twitter. “Não está em discussão a linguagem neutra em nenhuma escola pública ou privada de Palmas, simplesmente porque ela NÃO EXISTE. Não há incertezas sobre este tema. Já chega de Fake News sobre isso, causando pânico nas famílias e desconstruindo a minha imagem. Respeitem Palmas”, disse.
Alguns estudiosos tentam explicar essas mentiras, chamadas carinhosamente de fake news. Faz muito sentido o que diz Kai Shu, que com outros autores escreveu “Fake News Detection on Social Media: A Data Mining Perspective”, e Jacques Alkalai Wainberg, no artigo “Mensagens fakes, as emoções coletivas e as teorias conspiratórias”, quando buscaram esclarecer as nuances psicológicas em torno da fake news, quando dizem que os consumidores desse tipo de informação “tendem a acreditar que suas percepções da realidade são corretas, enquanto os outros são considerados desinformados”, ou pior quando esses “consumidores buscam apenas informações que confirmem seu ponto de vista”, reduzindo assim seu poder de discernimento da verdade e da realidade.
Nos tempos de hoje, com as pessoas vivendo seus radicalismos internos, cada vez mais acredita-se nas notícias convenientes. Por isso as mentiras atualmente se propagam numa velocidade impressionante. Elas, as fake news, encontram acolhida naqueles que necessitam delas para acalmar seus egos e acabam subvertendo a verdadeira verdade (a redundância aqui é proposital).
Para ser justo, o lado mais liberal também propaga e acredita em Fake News. Vimos isso quando a ex-primeira-dama Michele Bolsonaro foi acusada de ter mandando matar as carpas do espelho d’água do Palácio do Planalto para pegar as moedas que são jogadas por turistas. É mole? Evidentemente essa é uma notícia falsa e que foi propagada em meios de comunicação a ponto de Michele ter que se explicar publicamente nas redes sociais.
As redes sociais deram força às fake news. São ferramentas usadas para que pessoas digam o que quiserem quando quiserem. O fato é que não é bem assim. A sua liberdade termina quando a liberdade de outros é afetada. As redes sociais não são um ambiente sem lei. Quem ultrapassar os limites da lei será punido com o rigor que merecer. Fica a dica.